terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Ano meu, ano meu, anão

Ano meu, ano meu, ano teu, nosso ano, ano, aninho, anão,

Farei de ti o que não me permitas. Se me apontares a direita, presumo que adivinhas a resposta. Poderias ser o ano de sopas e descanso, mas não. Perdão. Serás ano de vendavais, outras sereias ruivas nas mesmas rochas; ano de gestos revolucionários com causa duvidosa e choro, quando o choro chegar. Serás para a vida o que o melhor vinho é para as papilas gustativas: choque, estranhamento, emoção, tesão, liberdade.

Abraço-te. Colho-te. Olho-te os olhos verdes também. Não há humanidade em estar sozinho numa casa a pensar no mundo. Estarei por aí, na rua, a misturar-te, com sal, com os teus primos mortos, com lendas do castelo, superstições e ternuras. Se tentares posar para revista de muita tiragem, ou se te apressares a comprar bolachas para o Chá das cinco, corto-te um pé e exilo-te em 2020, com os comentas. Hei-de beijar-te e morder-te num variação sem aviso. Hei-de dizer-te o que sobrar do cansaço e da esperança.

Quando vieres com ameaças de fim do mundo, respondo-te que tudo bem. Se não agora, quando? Fim do mundo seja. Tantas estrelas à espera para parir poetas. Viemos do mesmo pó e juntos ao mesmo pó voltaremos.

Entretanto, bebe um copo e junta-te à festa. Num bolso tenho duas eternidades para curtirmos nas próximas marés. No outro bolso uma folha pequena que diz: “xiu”!

Não te tomo como garantido. Não me tomes também. Sejamos corte russa, cocktail ousado, caminhada interminável, riso na catedral, sapatos grandes demais, lençóis de linho, eclipses em Nova Iorque, tradições mexicanas, atividade debaixo da mesa. Assumamos a sedução. Nenhum dos dois tem mais idade para fingir.

Aos que amo, permite, por favor, que façam de ti o que quiserem. Coloca a venda, mas deixa as algemas na gaveta. Temos uma divida gorda com o tempo e tencionamos pagar certinho em trezentas e sessenta e cinco prestações de gratidão.

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