segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Balada do Irmão

Um dia, brincava eu
Nas avelãs ou nas maças – já não sei bem
(onde havia um lago vazio, favorito
De saltar e correr)
E disseram-me a rir: vem aí um mano.
Não posso ser preciso, mas festejei,
Acompanhei, encostei, tive ciúmes - coisa pouca
e amei-te
Desde o primeiro dia.

Escolhi o teu nome,
Fosses menino ou menina.

E guardo hoje numa canção do Chico
o que sobrou da disputa
para a tua sobrinha-se-vier.
Escolhi o teu nome
mas não te escolhi. Não podia.
E se pudesse, não saberia onde encontrar-te.
Esse teu azul impossível
Em que tudo cai e rebola e se vê e revê, esse espelho.
Esse teu grande entusiasmo
Essas tuas zangas feias com coisas
Da vida. Esse teu perfume
- o melhor – que muda e é sempre o mesmo.
Essa tua percepção
De todos os aromas do mundo.
Esse teu ouvido de exigência total, esse
Teu bom-gosto-nova-iorque.
Esse teu desatino sereno
Com as coisas bonitas que há,
Com o bonito que há nas coisas.
Essa tua mão numa margem,
Essa tua mão na outra, esse
Caminho de que não nos deixas desistir.
Essas tuas paixões absolutas, enormes,
Esses teus golos que nem contas
Esse teu abraço que festeja mais que mil.
Esses pés pisando a terra até à raiz,
Esse renovado sentido na regresso.
Esses teus cuidados, como quem nem sabe
Essa tua sabedoria que não é daqui.
Essa tua opinião que se interessa, que chega perto
e amarfanha-raiva-jornais.
Essa tua visita diária quando não estás. Esse silêncio
Com mais literatura dentro
Que as bíblias, Odisseias e amigas.
Essa tua defesa do tipo que não tem, mais ainda
Do tipo que não pode.
Essa tua doçura a salgar na pele.
Esse encontro que espreito
Entre o que és e o que, a sorrir,

Nem desconfio.

(2012)

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